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Grupo de estudos – “O corpo encantado das ruas”, Luiz Antonio Simas

Cópia de Performatividade

Em mais um encontro do nosso grupo de estudos, lemos a segunda parte do livro O corpo encantado das ruas, de Luiz Antonio Simas, sob a condução de Flávia Fontes. A leitura foi um convite a perceber a rua não apenas como espaço físico, mas como território simbólico, sagrado, de disputa e de memória.

Flávia iniciou sua apresentação destacando que a rua, segundo Simas, é lugar de encontros, de encantamento e de resistência. O texto de Simas nos conduz a olhar para as “miudezas da vida”, como diz Flávia. Detalhes muitas vezes invisibilizados pelo olhar acadêmico tradicional, mas que carregam uma densidade simbólica e histórica imensa. Essa atenção ao cotidiano aproxima o autor de pensadores como Nêgo Bispo, que também valoriza os saberes que escapam às formas oficiais de produção de conhecimento.

A rua, como destaca o livro, é central nas religiões de matriz africana. É nela que os encantados e os orixás dançam, vivem e se manifestam. Simas afirma que essas entidades são “mortos que vivem”, ancestrais que nos acompanham nos caminhos e encruzilhadas. Essa sacralidade presente na rua resgata a importância do território urbano como espaço de espiritualidade e de conexão ancestral.

Flávia também nos conduziu por reflexões sobre as “pequenas Áfricas” – comunidades negras que, historicamente, desempenharam papéis fundamentais na ocupação de territórios no Rio de Janeiro, criando redes de proteção, pertencimento e identidade. O samba é um dos fios condutores desse processo: mais do que música, ele constrói sociabilidades, articula fé e política. O exemplo do abre alas  do desfila da Mangueira deste ano, com meninos negros soltando pipa, é símbolo desse protagonismo e do encantamento que brota das ruas.

Durante o encontro, foi abordada também a contradição entre o reconhecimento da estética e da cultura negra oriunda das favelas e a marginalização sistemática das pessoas negras que as produzem. A rua, nesse sentido, é também lugar de disputa simbólica e política: seu poder encantador confronta uma cultura de domesticação e controle dos corpos.

Simas nos lembra:
“O contrário da vida não é a morte. O contrário da vida é o desencanto.”
Em tempos de racionalidade acelerada, modernização urbana e apagamento das expressões populares, resgatar o encantamento das ruas é também resgatar o direito à vida plena, coletiva e enraizada em nossos saberes ancestrais.

Seguir atentos às miudezas, às encruzilhadas e aos cantos das ruas é também um gesto de resistência e de afirmação de uma outra forma de produzir conhecimento, uma forma que se funda no corpo, na memória, no mito e na ancestralidade.

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